Maraísa Santana |
Um dos casos que causou grande repercussão e que ainda é motivo de discussões e debates entre os doutrinadores mais célebres do direito brasileiro é o cumprimento de pena após decisão de segundo grau, quando a Constituição Federal é taxativa ao garantir ao cidadão o direito à ampla defesa, somente podendo ser considerado culpado e, portanto, cumprir pena, após o trânsito em julgado, isto é, quando não há mais recurso, esgotando-se todas as possibilidades de defesa (Art. 5º, inciso LVII da C.F. - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;).
O STF, ao decidir que a pessoa condenada em segundo grau deve cumprir imediatamente a pena, desconsiderou o princípio constitucional da presunção de inocência, ferindo direitos e garantias fundamentais , tal como o fez ao rejeitar o direito à desaposentação, a suspensão de processos da Justiça do Trabalho com base 4em direitos de acordos coletivos vencidos.
Mais recentemente, o STF decidiu, absurdamente, que o Poder Público pode, sim, promover o corte de ponto do servidor público no início do movimento grevista, emprestando à prática caráter de retaliação, inibindo o servidor de manifestar o seu descontentamento ante as práticas autoritárias e abusivas do Poder Público, autorizando-lhe agir ilicitamente, já que tal prática não encontra amparo legal e, consequentemente, torna desigual a relação jurídica entre trabalhador e Poder Público no momento de negociar.
O Direito de Greve do servidor público, tal como do trabalhador da iniciativa privada, está assegurado no art. 9º da Constituição Federal (É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender), sendo, portanto, autoaplicável, já que os servidores públicos não dispõe de legislação infraconstitucional própria, como dispõem os trabalhadores da iniciativa privada, regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho.
Há de se considerar que o servidor público, sendo órfão de uma legislação de greve, com essa recente decisão do STF, torna-se ”viúvo da Constituição Federal”, como pontua o advogado Rodrigo Camargo Barbosa, coordenador do Núcleo de Direito Público e Sócio Laboral do Escritório Cezar Brito & Advogados Associados, em recente artigo sobre o assunto, publicado na edição do dia3 de janeiro de 2017, da Revista Eletrônica Consultor Jurídico.
Sabe-se que somente o Poder Judiciário pode julgar se determinado movimento grevista é legal ou ilegal, não podendo o Poder Público, por si só, suspender, de imediato e automaticamente, pela via do corte de ponto, o pagamento de vencimentos de servidores que iniciarem uma greve, mormente porque se trata de uma questão disposta na Constituição e que não pode ser abalada como direito social e na condição de direito indiscutível, pétreo, da Constituição brasileira.
Acrescente-se, mais ainda, que salário é remuneração que se reveste de caráter alimentar, indispensável, pois, à sobrevivência do servidor público, dando à decisão do STF sobre o corte imediato de ponto do servidor público em greve, roupagem de MAIS UMA INSEGURANÇA JURÍDICA patrocinada pela nossa maior corte de justiça do país, maculando o Estado Democrático de Direito que serviu de inspiração e tornou-se propósito da nossa Constituição Federal.
*Maraísa Santana é advogada, especializada em Direito Público e Controle Municipal, integrante do Escritório SANTANA ADVOCACIA, com unidades em Senhor do Bonfim (Ba), Salvador(Ba) e Brasília (D.F.).