ARTIGO: UMA TRISTE IMAGEM DE SENHOR DO BONFIM


Abandono, desprezo, irresponsabilidade e exclusão social. Eis ai os ingredientes famigerados que estão legando à cidade de Senhor do Bonfim uma legião de adolescentes delinquentes, entregues à própria sorte. Estão mergulhados na ignorância e sem perspectiva de inserção social, seja pela via da educação ou do emprego. É um quadro dolorido cujas raízes estão ligadas, principalmente, ao desajuste familiar e à falta de políticas efetivas de amparo ao menor e de combate ao tráfico de drogas. A catástrofe social é iminente. Anuncia-se uma alta demanda por saúde pública, e sobretudo, de maneira equivocada, por segurança pública. O 6º BPM já sente os efeitos iniciais dessa realidade que se vislumbra num horizonte dantesco.

A imagem acima pode não parecer impactante. Todavia, quando observamos as pontas dos dedos, indicador e polegar; percebemos que estão queimados. Este é o traço mais característico de um usuário de certos tipos de drogas, ou de fumo “pacaiá”. No caso da imagem, era um “jovenzinho”, flagrado consumindo entorpecente. Na ocasião nos afirmou ser viciado, e para sustentar o vício, segundo ele, pratica pequenos furtos e roubos, dirigindo-se, posteriormente, à “boca” para trocar por drogas. No dia desse episódio, em uma abordagem rotineira e rápida, flagramos cerca de 30 garotos na mesma faixa etária em situações assemelhadas no mesmo bairro. Situações análogas, flagradas em diversos pontos da cidade, nos levam a afirmar que a periferia da cidade de Senhor do Bonfim está infestada desses garotos em total estado de vulnerabilidade social.

É como se estivéssemos diante dos novíssimos “Capitães de Areia” (Jorge Amado), em um novo “Trapiche”. A periferia de Senhor do Bonfim, no que diz respeito a estes adolescentes, é um imenso “Trapiche”. Estão se formando e se desenvolvendo de maneira própria e autônoma, fazendo suas próprias regras. Um bando de garotos agressivos, esfomeados, viciados, intrépidos e desamparados. São senhores dos seus destinos, vivendo em um cenário que muito se aproxima do “Pátio dos Milagres”, apresentado por Victor Hugo em O Corcunda de Notre-Dame. Não respeitam os pais, não respeitam professores e entendem que o mundo é uma imensa escola. Não veem fundamento e nem entendem o sentido da educação escolar. Miram no ópio e compreendem que inserção social só acontece quando atingem a “ostentação” apresentada em certas canções de funk e pagodão. São canções que incentivam o acesso precoce ao sexo, além de pregarem o desrespeito ao sexo feminino. Acabam contribuindo, também, com a gravidez na adolescência e consequente agravação do problema em questão, pois geralmente os filhos crescem sem referência e sem estrutura familiar adequada.

A coisa é alarmante. Uma analisada nas planilhas de junho/2016, se observa que quatro armas de fogo foram apreendidas em posse de menores, e, quase que cotidianamente apreendemos armas brancas e drogas ilícitas em poder de adolescentes. Os garotos estão entrando na maioridade sem nenhuma resistência, ou referencial, de que a prática delituosa, constitui desvios de conduta nocivos à vida em sociedade. Esse comportamento desvirtuado dos menores nos causa estranheza, entretanto, mais estranheza nos causa o aspecto mórbido das instituições ante a escalada da delinquência juvenil em nossa cidade. Parece que já “jogaram a toalha”, ou não querem sair da zona de conforto. A PM não suporta, nem tampouco é a melhor opção para lidar com essa situação, bastam às conseqüências dessa mazela social sobre nossos ombros. Somos o castigo de Zeus a Prometeu acorrentado. Fazemos nosso serviço em um dia, e no dia seguinte tornamos fazê-lo, nos mesmos locais, e com os mesmos infratores, de forma amiúde. Não tem fim.

Importante destacar também os delinquentes da área central da cidade. Estes têm pais e mães e não se encontram em estado de vulnerabilidade social. Estão bem vestidos e apresentáveis. Mas são igualmente consumidores de drogas e viciados. Estes sustentam em boa parte a engrenagem criminosa do tráfico na cidade. Fazem uma migração pendular para adquirirem drogas nas áreas periféricas da cidade. Estes oprimem aqueles, e aqueles, engolem estes de maneira recíproca e bem perceptível. Os usuários da área central quase sempre enganam seus pais, que com sua inocência e excesso de confiança nos filhos, julgam que seus bebês são incapazes de consumir droga, isto é coisa de família desajustada, pensam. “Ledo engano”. E as amizades? E os locais que frenquentam? Enfim, quando os pais descobrem, já não é novidade para a polícia, exceto para o seu coração de boa fé e ingênuo.

É preciso a união de todos. As famílias, as igrejas, as escolas, o executivo, o legislativo, o MP, o judiciário, o legislativo as polícias, conselho tutelar, mídia etc. Todos devem unir-se e de maneira efetiva planejar ações para impedir que a cidade se acometa de uma convulsão social e se transforme em um antro de inválidos. Faz-se necessário tão-somente a ação. Devemos ser poupados dos discursos falaciosos e românticos sobre a delinquência juvenil. Para isso, no âmbito estadual e federal, já temos muita candura e demagogia que não ajudam em nada o combate ao tráfico de drogas e à delinquência juvenil.

Se nada for feito, muito em breve, teremos uma legião de zumbis parambulando pelas ruas de Bonfim. Irão atacar as pessoas em busca de dinheiro, ou objetos que possam ser transfomados em dinheiro para sustentarem seus vícios. É como expôs Nicolau Maquiavel em seu sublime livro, O Príncipe, publicado em 1513: “... No princípio é fácil a cura e difícil o diagnóstico, mas no decorrer do tempo, se enfermidade não foi conhecida nem tratada, torna-se fácil o diagnostico e difícil a cura”.
A PM está nas ruas 24h por dia de maneira incessante. Todavia, em meio a centenas de atores sociais, reconhecemos que não somos os mais eficazes a lidar com tal situação, embora recaia sobre nós uma cobrança injusta e desmedida.

Lamentavelmente a imagem acima reflete um problema social grave na cidade de Senhor do Bonfim. Muitos estão dormindo para este fato. A fatura chegará para cada um na posteridade se nada for feito.


por Elielton Cordeiro da Paixão.
Tenente da PMBA/Licenciado em Historia – UPE/Bacharelando em Direito - UNEB
Postagem Anterior Próxima Postagem