*Josemar Santana
AINDA HÁ MUITAS PENDÊNCIAS
A Lei Complementar à Constituição Federal do Brasil, nº 135/2010, de 4 de junho de 2010, conhecida popularmente pelo nome de “Lei de Ficha Limpa” alterou a também Lei Complementar à Constituição Federal do Brasil, nº 64/90, de 18 de maio de 1990, apelidada de “Lei de Inelegibilidades”.
Ambas estão sustentadas no §9º, do art. 14, da nossa Constituição, que estabelece: “Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta”.
Significa dizer, que além dos casos citados no art. 14 da Constituição Federal, como causas de elegibilidade e condições de inelegibilidade, LEI COMPLEMENTAR está autorizada a estabelecer “outros casos de inelegibilidade”, bem como, os prazos que essas condições cessam, terminam.
A Lei Complementar nº 64/90, trouxe mais casos de inelegibilidades, além dos contidos no art. 14, da Constituição Federal, mas não tratou diretamente da proteção aos casos de probidade administrativa, da moralidade para o exercício do mandato, com base na vida pregressa do candidato e, também, da influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.
Para alcançar essa imposição constitucional chegou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei de iniciativa popular, subscrito por cerca de 1 (um) milhão e meio de assinaturas de cidadãos, residentes em todos os Estados brasileiros e que resultou na aprovação legislativa e posterior sanção presidencial, da Lei Complementar 135/2010.
Até aí, tudo ocorreu como previsto na Lei Maior do país: a iniciativa popular se fez na forma estabelecida pela Constituição, a tramitação obedeceu às normas regimentais do Congresso e a Lei Complementar 135/2010 entrou em vigor na data de sua publicação, isto é, no dia 4 de junho de 2010.
A partir daí vieram os questionamentos sobre a sua constitucionalidade, principalmente, os seguintes:
A. - quanto à sua aplicação imediata, nas eleições de 2010, já que a Lei Complementar passou a vigorar faltando quase 4 (quatro) meses para a data das eleições gerais de 2010, o que é vedado pelo art. 16, da Constituição Federal que dispõe: “A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, NÃO SE APLICANDO À ELEIÇÃO QUE OCORRA ATÉ UM ANO DA DATA DE SUA VIGÊNCIA”;
B. - e quanto ao desprezo ao PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DA INOCÊNCIA, que significa dizer, que todos os acusados serão considerados inocentes ou não culpados, até que uma sentença transitada em julgado, isto é, que não tenha mais recurso, seja prolatada, condenando o acusado.
O PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DA INOCÊNCIA está disposto no inciso LVII, do art. 5º, da Constituição Federal, nos seguintes termos: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de SENTENÇA PENAL condenatória”. É na expressão SENTENÇA PENAL que se apegam os defensores da aplicação das restrições impostas pela Lei Complementar nº 135/2010, para sustentarem que o trânsito em julgado somente vale para as QUESTÕES PENAIS (previstas na legislação penal), ficando de fora as QUESTÕES CIVÍS (responsabilizações por prejuízos aos cofres públicos, por exemplo), ADMINISTRATIVAS (práticas de improbidades) e ELEITORAIS (ofensas às normas eleitorais).
Considerando que OS PRINCÍPIOS são os geradores das NORMAS (leis, estatutos, etc), o próprio STF (Supremo Tribunal Federal), a nossa Maior Corte de Justiça, responsável pela interpretação da nossa Constituição, considera que o dispositivo contido no inciso LVII, do art. 5º, da Constituição Federal “É EXTENSIVO AOS DEMAIS RAMOS DO DIREITO”, não PODENDO FICAR RSTRITO APENAS À LEGISLAÇÃO PENAL , já que a própria Constituição impõe no inciso LV, do art. 5º que: “aos litigantes, EM PROCESSO JUDICIAL (entenda-se PENAL, CIVIL, ELEITORAL etc) OU ADMINISTRATIVO e aos ACUSADOS EM GERAL são assegurados o CONTRADITÓRIO( o direito do acusado mostrar que a acusação contra si não é verdadeira) e AMPLA DEFESA (tudo o que dispuser para se defender), com OS MEIOS E RECURSOS (buscar todas as instâncias do Poder Judiciário que existirem, para provar a sua inocência) A ELA INERENTES”.
Logo, enquanto houver MEIOS RECURSAIS, o acusado deve ser considerado inocente, em obediência ao PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DA INOCÊNCIA, uma imposição típica do Estado Democrático de Direito, não devendo prevalecer qualquer decisão condenatória oriunda de TRIBUNAL REGIONAL, de TRIBUNAL DE CONTAS ou de CONSELHO DE CONTAS, de CÂMARAS DE VEREADORES, DE ASSEMBLÉIAS LEGISLATIVAS OU DO CONGRESSO NACIONAL, porque a nossa Constituição impõe o direito do cidadão se valer dos MEIOS E RECURSOS que estiverem ao seu alcance, mesmo porque, impõe o inciso XXXV, do art. 5º, da Constituição Federal: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário a lesão ou ameaça a direito”.
Muitas outras questões deverão ser levantadas por iniciativa de interessados que se sentem prejudicados e o STF, agora, com sua corte completa (onze) Ministros, vai decidir todas elas, até definir a real aplicação da Lei Complementar nº 135/2010, que por enquanto tem duas questões bem definidas: 1 – não será aplicada para as Eleições de 2010, em observação ao disposto no art. 16, da Constituição Federal; 2 – será aplicada aos agentes públicos que renunciaram ou venha a renunciar a seus cargos, na tentativa de se livrarem de processos.
*Josemar Santana é jornalista e advogado